Resenha Cinematográfica - "Gigantes (2024)" - Documentário

Uma maneira bastante saudável e verdadeira de buscar uma razão de viver é participar, estar ativo e seguir em frente tendo como norte um símbolo, uma bandeira ou uma causa. Há muitas maneiras de se fazer isso: associando-se a um clube, frequentando uma igreja, realizando trabalhos de cunho voluntário, doando um pouco de seu tempo a um semelhante escrevendo cartas... estes são apenas alguns dos exemplos possíveis e plausíveis de se optar, para deixar nossos corações aquecidos e constantemente treinados à prática do bem. 

A gente não pode deixar de falar: sim, temos pensamentos ruins. Desejamos coisas inapropriadas em alguns momentos a algumas pessoas, especialmente as que nos importunam constantemente (no jargão mais moderno convencionou-se denominá-las "pessoas tóxicas"). Isso faz parte da natureza humana, mas certos acontecimentos deveriam constituir-se em um divisor de águas quanto às atitudes e maneiras de protestar perante histórias de insucesso que nos circundam. 

O universo futebolístico nos reserva isso. Resgatemos na memória as diversas ocasiões onde, por conta de uma sequência de derrotas e o surgimento de uma grave crise, a ponto de culminar em um rebaixamento de divisão, patrimônios de clubes foram total ou parcialmente destruídos? Há vários casos na linha do tempo em que as ações destas pessoas destruíram parte da história de uma agremiação. 

Nem todos gostam de futebol, é claro. E alegam que é alienante, viciante e não agrega culturalmente, além de valorizar demais determinados jogadores, com seus salários inflacionados demais.. Apesar de respeitar tal opinião, discordo dela, pois quando assistimos o documentário "Gigantes" (2024), acabamos nos deparando com um outro prisma de um clube: o seu quadro de funcionários. 

O ocorrido dentro do complexo do Sport Club Internacional, ao mesmo tempo podemos definir como um microcosmo em relação à tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, e um macrocosmo dentro da história do Inter. Isso porque, prosseguindo com o citado no parágrafo anterior, para se ter um referencial, a reconstrução do complexo colorado envolveu pelo menos 600 colaboradores e durante o filme todo este esforço é retratado, de uma maneira sensível, emocionante e didática. 

Conseguimos abrir nossa mente e compreender portanto a importância do planejamento e mobilização em qualquer área profissional. Durante a tragédia das chuvas, milhares de voluntários, além dos profissionais ali envolvidos, destinou seus esforços para salvar pessoas e recuperar lugares. Nos clubes de Porto Alegre (aí também podemos citar o Grêmio de Football Porto Alegrense), apesar de não ter ocorrido perda de vidas, parte da história secular de ambos se foi. 

A criação destes vínculos é explicável pela emoção e pela sensação de pertencimento, enraizamento e formação de uma linha do tempo de importância secular para as fileiras da agremiação pela qual se está vinculado. No caso do Inter, retomando um pouco a história, este vínculo foi reforçado pela alcunha de "o clube do povo", mas também durante a construção do estádio ("Gigante da Beira-Rio"), processo pelo qual houve efetiva participação das pessoas, em momentos como a chamada "campanha do tijolo". Esta, lançada em 1967, contou com o engajamento de alguns jogadores, tendo sua divulgação inicial realizada por jogadores notórios à época como Carlitos e Tesourinha. 


Até mesmo no processo de construção, um dos maiores ídolos da história do clube participou. Paulo Roberto Falcão pôs literalmente a "mão na massa" para erguer o gigante, às margens do Guaíba, conforme atesta a foto abaixo (carregando carrinho de cimento). 


Assistir ao documentário nos mostra o poder das pessoas além da sua participação cotidiana no funcionamento de empresas. No caso, como existe a soma de fatores (vínculo funcional + vínculo afetivo + mobilização em prol de uma recuperação), aliada a um verdadeiro batalhão (cerca de 600 funcionários, conforme já citado), a paixão e a identificação tornam-se o elemento principal do roteiro, bem como o sentimento de que, ao restaurar o microcosmo, tão identificado com o povo gaúcho, uma força adicional é enviada aos demais extratos da sociedade para esta reconstrução. 
Por fim, gera-se uma reflexão geral: uma insatisfação momentânea, uma rivalidade, uma contenda, deve ser resolvida na base do diálogo, da conciliação. Destruição de patrimônio não leva apenas ao desaparecimento de relíquias, troféus, certificados e outros símbolos de conquistas, mas também um pedaço do esforço, dedicação e carinho de recepcionistas, guias, museólogos, encarregados de manutenção e outra dezena de profissionais envolvidos na conservação destes ambientes. A construção e o estabelecimento de uma bonita história, não pode ser substituída, tampouco ofuscada por revezes, normais ao longo do tempo. 

O documentário pode ser assistido via YouTube no canal oficial do Sport Club Internacional. Link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=E4LSwvcMAYQ. Ou para os assinantes, no Sportv, dentro da programação. 

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